Entrevista ao Correio Braziliense : Adelmir Santana, presidente da Fecomércio/DF

Adelmir Santana CB

ENTREVISTA: ADELMIR SANTANA » Discurso contra o pessimismo

sexta-feira, julho 17, 2015    Comentários

“Eles (pequenos empresários) pensam: não vou aumentar a lojinha, não vou abrir um novo mercado, vou esperar a passagem desta crise. Então, seria preciso que houvesse uma palavra de incentivo, que alguém fosse mais otimista”

“É preciso que haja uma perfeita integração entre o governo do DF e o governo de Goiás, na busca para encontrar uma solução de desenvolvimento desses municípios”

“Temos de criar alternativas para aumentar a receita, mas isso deve ser feito com muito cuidado, com muita atenção, com muita discussão”

Presidente da Fecomércio, Adelmir Santana avalia que o medo da crise afasta investidor de parcerias propostas pelo governo Rollemberg

Em clima de pessimismo, crise e dívidas ainda não honradas do Governo do Distrito Federal, nenhum empresário vai tirar dinheiro do bolso para investir em parcerias público-privadas e concessões, como espera o Executivo local. A avaliação é do ex-senador Adelmir Santana, hoje sem partido, presidente da Federação do Comércio no Distrito Federal (Fecomércio-DF) e profundo conhecedor do  comportamento do empresariado. Ele fala com a autoridade de aliado, de quem desembarcou da candidatura de Jofran Frejat para apoiar Rodrigo Rollemberg no meio da campanha do ano passado. Para Adelmir, diante de um cenário de medo generalizado na economia, principalmente entre os investidores, faltam políticos com discursos de otimismo, que apresentem resultados efetivos à população.

Adelmir diz que acredita na atual gestão socialista e não se arrepende da escolha. Mas cobra de Rollemberg atitudes mais positivas. “Falo para ele buscar as alternativas que a sociedade deseja”, dispara. Ele reforça o discurso do senador Cristovam Buarque (PDT-DF) — em entrevista ao Correio no último domingo — da necessidade de Rollemberg usar a criatividade diante da falta de recursos públicos. Como representante do setor produtivo, classifica de tímida a aproximação do GDF com o empresariado e aposta no turismo como saída para o desenvolvimento do Distrito Federal.

Durante a campanha, o senhor declarou voto em Rollemberg. Seis meses depois do início da gestão, que análise o senhor faz? Apoiou o candidato certo?

Apoiei explicitamente. É que ele pegou uma máquina extremamente avariada. Muitas loucuras que foram reveladas durante esse período de transição, aumento desenfreado para algumas categorias econômicas, compromissos não honrados, saldos insignificantes nas contas públicas, embora a oposição diga o oposto. A sociedade ficou com dúvida quanto a isso. Mas, a cada dia, parece-me que isso vem sendo esclarecido pela nova equipe. Eu ainda tenho esperanças, confio. Acho que a opção do momento, na minha visão, foi acertada. Enxergo o governador eleito como um homem sério, honesto e de boas intenções. Não tenho arrependimentos por isso. Tenho cobrado do governador mais energia, mais criatividade. Falo para ele buscar as alternativas que a sociedade deseja. Até disse para ele: “Quando o eleitor escolhe alguém para dirigente do Executivo, deposita nele esperança de mudança e de ações rápidas”. Ele é jovem, inteligente e tem bons propósitos. Vamos achar um bom caminho.

Rollemberg tem bom diálogo aberto com o setor produtivo?

Inicialmente, foi muito tímido, mas me parece que, a cada instante, isso vai se ampliando. É necessário que um governante dialogue além dos poderes constituídos, com as forças do Estado, da sua cidade, e as forças não apenas políticas, mas de interesse corporativo, das representações, das entidades representativas, do próprio setor produtivo, que, em última análise, é quem gera emprego, renda e cobra impostos.

O nome do senhor chegou a ser cotado para ocupar uma secretaria, certo?

Não. Isso nunca aconteceu. Talvez por toda esta relação de apoiamento, de amizade. Mas, na verdade, eu nunca fui auscultado para fazer parte da equipe. Até porque, quando dei apoio, uma das condições que coloquei foi a de que não fizesse parte do governo. Não quero participar efetivamente da parte executiva. O que eu desejo é que dê certo, porque eu acredito nesse projeto, eu acredito na cidade.

Quais medidas o governo pode adotar para aquecer a economia do DF?

As soluções para o Distrito Federal de ordem econômica estão fora do perímetro do DF. Estão na Região Metropolitana, que, de direito, não existe, mas existe de fato. É preciso que haja uma perfeita integração entre o governo do DF e o governo de Goiás na busca para encontrar uma solução de desenvolvimento desses municípios. Todos nós presenciamos, no amanhecer, um volume enorme de população vinda dessas regiões para o DF, na busca por sobrevivência para manter o seu emprego, atrás de um bico, de uma atividade qualquer. É um sofrimento muito grande. Ao mesmo tempo, ela (população) usa equipamentos públicos que, normalmente, não têm nas regiões de origem. Acho que essa região precisa ter um dono para que não ocorram problemas mais graves, como, por exemplo, o da Baixada Fluminense.

Acha que a vocação do DF é essa de serviços, de comércio?

Pela própria história, aqui é uma cidade administrativa. Nós temos uma vocação para comércio e serviço em turismo. Uma cidade que tem uma forte presença na área gastronômica, de hotelaria, de belezas arquitetônicas, até o nosso ipê vem sendo exaltado. Então, essa é uma cidade que precisa ser vendida, não para nós, mas para outros. Imagine se nós fizéssemos um planejamento turístico com as universidades na área de arquitetura. Imagine se o GDF fizesse uma campanha com faculdades de arquitetura do país objetivando trazer estudantes de arquitetura para visitar o Projeto Brasília. Imagine se fizéssemos um acordo com todas as faculdades de direito para trazer os estudantes a visitar Brasília por um período, subsidiando-os. Imagine se pudessem assistir a uma sessão no Supremo, ver como funciona o Congresso, os tribunais superiores. Isso é uma aula, é um estágio de cidadania. Mas imagine também pegar estudantes de serviços sociais para ver as mudanças na cidade, o turismo religioso. Tudo isso como política de Estado.

O turismo, então, é a saída para o crescimento?

Não há dúvida. Isso movimenta tantas atividades, mais de 60. Vai do engraxate aos taxistas, embora eles tenham problema com o Uber. Por que não incorporar os taxistas?

Falando nisso, a grande dúvida é se o governador vai sancionar ou vetar o projeto que proíbe o Uber. O que o senhor acha?

Acho que tem de legalizar. Por que não incorporar esses taxistas? Não é com esses carros sujos e com essa qualidade de serviço que temos. Quem conhece mais a cidade do que os taxistas? Vamos treiná-los para se incorporarem aos projetos e financiar novos carros. Olha o quanto movimentaria o comércio. Temos de nos posicionar para o futuro.

O comércio está vivenciando a pior crise?

Já vivemos outras crises, mas, no momento, é a mais sensível e evidente, por ser a mais recente. As comunicações não eram como hoje e há um inconformismo. As pessoas estão agitadas, muito preocupadas, e vai passando de uma para outra. Sou otimista, acho que quem exerce função de governo tem de dar palavra de otimismo. Há um pessimismo generalizado e isso não é bom.

Está decepcionado com a política ou quer voltar?

Acho a política uma forma grandiosa de servir e tratar os interesses coletivos, de participar da vida do seu país. Mas não tenho nenhuma intenção de candidatura. Acho que devo servir a minha cidade, como venho fazendo há anos, com atividades representativas, de outras formas. Continuo fazendo política todos os dias, mas de outras formas, sem nenhuma vinculação partidária.

Há tantas lojas fechadas na W3. Isso é a crise ou há outros componentes?

Tem a crise e também as próprias mudanças de comportamento do consumidor. Em nenhuma cidade do país e do mundo, há tantos centros comerciais como em Brasília, como os shoppings. Isso por conta do estacionamento, da segurança, do ar-condicionado. Cada shopping tem 300 lojas. O projeto da W3 de revitalização se discute há muitos anos, mas quando começou o seu esvaziamento? Quando surgiu o Conjunto Nacional e, depois, o ParkShopping. Temos de repensar isso. Muitos projetos foram apresentados, inclusive de mobilidade, mas que não chegaram a bom termo. Há um volume de prédios que estão se deteriorando. O que se imaginava com o plano de Brasília? Que o comércio local tivesse o sentido de atender por conveniência, que são lojinhas, padarias, farmácias, peixarias. Cada quadra tinha mais de um açougue. Hoje, não existem mais açougues nas quadras comerciais. Por quê? Porque foi um segmento absorvido pelos supermercados. Aí, entra a criatividade. Outro projeto que se discute é a ocupação de áreas públicas. Por que não se incentiva a abertura do comércio em vias como a W3? Incentiva com a redução do ISS e do IPTU, com o empréstimo subsidiado.

O senhor é a favor desse tipo de projeto?

Assim você desestimula o uso da área pública, que não é escriturada. Como? Cobrando caro pela sua ocupação. Vamos transformar aquela área (W3) em uma grande área de lazer, de floricultura, de restaurantes.

Então, muito pode ser feito, mesmo sem dinheiro?

Podem ser feitas algumas coisas sem dinheiro no caixa. Sou contrário ao aumento de tributo, seja ele qual for. Temos é de incorporar novos contribuintes, como aqueles que estão fora da legalização.

O governo fala que não quer aumentar imposto, apenas corrigir a base de cálculo do IPTU…

Mas essa é uma forma de enrolar a todos. Porque, se for corrigir, tivemos um “boom” no aumento do preço dos imóveis em Brasília, exatamente no período da última avaliação. É bom que não se esqueça disso. Quando se lançou os apartamentos do Noroeste, eles tinham  valor muito maior do que o de hoje. O que quero dizer é que temos de criar alternativas para aumentar a receita, mas isso deve ser feito com muito cuidado, com muita atenção, com muita discussão.

Acha que o governo tem força para desocupar a orla do lago?

Pode ter força, mas não tem recursos para manter essas áreas. Não adianta tirar quem está cuidando, pegar a área e não cuidar dela. Vai ser uma catástrofe. Temos de pensar que a orla é uma coisa enorme. Se o governo tivesse um projeto para ocupar com qualidade, aí, sim. O que nós temos para oferecer às pessoas para passear no lago? Praticamente nada.

Sobre as concessões e as PPPs, o senhor acha que elas podem ser feitas em quais áreas?

O governo não precisa administrar determinados equipamentos, como zoológicos, estádios e alguns centros de cultura. Isso pode ser terceirizado, com clareza e qualidade. Mas a primeira coisa que tem de ter é a confiança. Imagine um governo que passa por um momento de desconfiança no pagamento de contas. Quem é que vai investir dinheiro? Esse é o pensamento do investidor.  Isso vale para todos, local e nacional. Um dos princípios básicos é recuperar a confiança para que as pessoas acreditem. Vimos umas concessões que foram colocadas e que não apareceu ninguém interessado.  

Mas o senhor é a favor da terceirização da saúde?

A nossa Constituição faculta que isso pode ser feito pela iniciativa privada, mas acho que algumas funções são obrigações do Estado, como saúde, educação, segurança e até mobilidade. Como vai privatizar a segurança do cidadão, a segurança patrimonial? Não tem como. São funções do Estado.

O governo estuda a gestão compartilhada de hospitais, como temos a do Hospital da Criança. O que o senhor acha?

Acho que pode acontecer, mas tem de que ir com calma. Já temos uma forte presença da iniciativa privada na área da saúde, mas acho que tem que ser  para complementar a função do Estado e não o oposto.

Como avalia o cenário político-econômico atual?

Há alguns anos, pesquisamos empresas de pequeno e médio portes. Até o fim de 2012, essa pesquisa apresentava resultados crescentes, muito maior do que os índices nacionais. Foi o “boom” de desenvolvimento da micro e pequena empresa em Brasília e no país. As pessoas estavam atrás de comodidade, de proximidade, em razão da estabilidade da moeda, das baixas taxas de juros. Houve um bom crescimento do comércio de serviço em Brasília nos anos sucessivos. Isso fez com que todos crescessem, inclusive os pequenos negócios. Mas, à medida que você dificulta o crédito e há a diminuição da confiança e da ameaça do desemprego, o consumidor começa a restringir os hábitos de consumo, com medo do futuro. Isso atrapalha. O que estamos vivendo é um excesso de pessimismo.

O pessimismo piora com a instabilidade política?

Não há dúvida. Na medida em que falta um norte, projetos de infraestrutura e de investimentos, o mundo empresarial se retrai. Os investidores, mesmo tendo recursos, ficam esperando para ver o que vai acontecer. Então, mesmo os que dispõem de recursos ficam reticentes, aguardando um desfecho em nome da segurança (econômica), da confiança, da segurança jurídica. Imagine você fazer um investimento e descobrir, depois, que mudam todas as regras. Isso também ocorre nos pequenos negócios, com os pequenos empresários. Eles pensam: “Não vou aumentar a lojinha, não vou abrir um novo mercado, vou esperar a passagem desta crise”. Então, seria preciso que houvesse uma palavra de incentivo, que alguém fosse mais otimista.

O fato de a presidente ter dado uma declaração dizendo que não renuncia deixa o cenário mais calmo?

Se alguém vai julgar a presidente, é o Poder Legislativo. Certamente baseado (em provas), se houver essa reprovação das suas contas. Essa é uma vertente. A outra vertente é que ela é objeto de denúncias no Tribunal Superior Eleitoral, que é outro fórum de julgamento. Aí, estão centradas duas vertentes: a que julga a questão da própria campanha, e a outra, que julga o governo. 

O setor produtivo espera para ver o que vai acontecer depois disso?

Isso é um sentimento que existe na cabeça de todos, principalmente dos mais bem informados, dos investidores internacionais. Passamos por uma crise envolvendo os grandes empresários.

O fato de grandes empreiteiros estarem atrás das grades também assusta os investidores?

É um fato sui generis. É preciso buscar uma alternativa, porque algumas empresas são multinacionais. Não sabemos se são as empresas ou se são as pessoas. Olha a que ponto chegamos. Há a tese de que as empresas não devem participar de futuras licitações, de futuros projetos, mas há também quem defenda em trocar as pessoas. Assim, ficam as empresas. Todas essas coisas estão em julgamento, estão em análise, e contribuem para o momento em que estamos vivendo de insegurança.

Fonte: Ana Maria Campos – Mariana Laboissière – Correio Braziliense – Foto – Ronaldo Oliveira /CB/D.A Press.

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