O Brasil acompanhou o último capítulo da novela Amor à Vida quando o médico César (Antonio Fagundes) levou uma cusparada da vilã Aline (Vanessa Giácomo), por vingança, e por ter nojo dele.
O simples ato de cuspir em alguém não se constitui um crime, mas cuspir em alguém de forma acintosa é injúria, um dos crimes contra a honra previsto no artigo 140 do Código Penal. A doutrina tem mostrado que trata-se de injúria real porque praticada por meio de violência ou vias de fato com a finalidade de humilhar ou zombar.
O artigo 140, § 3º, estatui que injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. O ofendido precisa entrar com queixa-crime na Justiça porque trata-se de ação penal privada.
Há juristas que entendem que se a vítima da cusparada alegar e provar que houve preconceito contra a sua pessoa, pode haver o entendimento de que se trata de delito de racismo. A Lei 7.716/89 define os crimes resultantes de preconceito racial ou de cor. A legislação determina a pena de reclusão a quem tenha cometidos atos de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Muitos doutrinadores sustentam que sendo a injúria racial um tipo específico, ela prevalece em relação ao racismo. Há controvérsias e muitas discussões sobre o tema.
Existem, ainda, outros que sustentam que uma cusparada em outrem pode ser um crime de desacato. O desacato é um crime previsto no artigo 331 do Código Penal e que consiste em desacatar, ou seja, faltar com o respeito para com um funcionário público no exercício da função ou em razão dela. Caso um agente cuspa em um funcionário público nessas condições pode ser responsabilizado por tal ilícito penal.
No nosso Direito Penal existe a figura da absorção. A jurisprudência tem entendido que o crime de desacato subsume-se, entra, absorve-se o delito de injúria, haja vista que desacatar nada mais é do que ofender a dignidade ou o decoro do servidor público, no exercício de suas funções. Prevaleceria o desacato em detrimento ao outro delito.
Pode ser que haja outros tipos penais previstos em lei para o ato de se cuspir em alguém. Afinal, o Direito é controverso.
No âmbito cível o autor da cusparada pode responder a uma ação de indenização por danos morais e ser condenado a pagar uma “bolada” em dinheiro para a vítima, dependendo do caso.
Assim, sendo um crime ou não, cuspir em alguém não é correto e se constitui também numa grande falta de educação e respeito ao próximo. Houve um homem no passado que levou cuspe no rosto em zombeteira e apanhou muito antes de ser crucificado: Cristo. Se foi ou não vítima de crime, nesse aspecto, aprendamos com o Mestre. Quando cuspiu no chão, ele fez lodo e curou um cego. Usou o cuspe para o bem.
Jesseir Coelho de Alcântara é Juiz de Direito e Professor