Bronze em Toronto, aluno do CID Sobradinho conta com ajuda da família de atletas

Treinamento em família forma campeão pan-americano

  Bronze em Toronto, aluno do CID Sobradinho conta com ajuda do pai, professor aposentado, e da mãe, sete vezes campeã brasileira de marcha atlética

Treinamento em família forma campeão pan-americano
Fotos: Tiago Oliveira – Ascom/SEDF

Elton Pacheco, Ascom/SEDF

Lá se vão mais de 30 anos desde que João Sena, professor de educação física da rede pública, hoje servidor aposentado, pisou pela primeira vez no Estádio Augustinho Lima, em Sobradinho. No local funciona um dos 113 centros de iniciação desportiva do DF, os chamados CIDs, criados pelo governo de Brasília para incentivar a prática do esporte e a formação de futuros atletas.

Foi nas pistas deste estádio que o educador físico ajudou a identificar e treinar atletas medalhistas em competições nacionais e internacionais, como Hudson de Souza, Carmem de Oliveira, Solange Cordeiro e Gianetti Sena, sua companheira há mais de 30 anos. Juntos, Sena e Gianetti treinam o próprio filho, Caio, medalha de bronze nos Jogos Pan-americanos de Toronto.

Hoje, aproximadamente 9 mil alunos estão matriculados em 17 modalidades esportivas, que vão do atletismo ao handebol, passando pela ginástica rítmica à capoeira. Só no atletismo são 335 alunos. Nas modalidades esportivas do Estádio Augustinho Lima são 80. A maioria é treinada por educadores físicos como João Sena, hoje voluntário, e outros professores, como Valtinho Pereira da Silva. “Nunca coloquei peso em nenhum aluno. É uma modalidade difícil, que a gente tem muito mais tristezas do que alegrias, mas que no final das contas é recompensadora. Por aqui, tento mostrar pra eles que todos são capazes e que podem chegar longe”, diz João.

Em 1990, para tornar mais efetivas as competições e captar patrocínio, João Sena criou o Centro de Atletismo de Sobradinho, o Caso. Os atletas do projeto patrocinado pela Caixa Econômica Federal já conquistaram 24 títulos brasileiros e nove sul-americanos, e estiveram presentes em quatro Olimpíadas. Em 2014 foram 26 medalhas conquistadas em competições nacionais. O Caso funciona no Augustinho Lima e também conta com alunos do CID. “Os projetos são complementares e o objetivo é o mesmo, de aliar o esporte à sala de aula, identificando e treinando novos atletas”, explica João Sena.

O próprio Caio é resultado disso. Aluno do CID Sobradinho e do Caso desde que “se entende por gente”, como brinca o pai, o filho do treinador representa uma esperança para outros alunos do projeto que, assim como ele, lutam por bons resultados. “O valor dessa medalha conquistada em Toronto é a possibilidade de tornar a marcha atlética conhecida para que mais pessoas acreditem na modalidade e invistam nos atletas. Quero que novos talentos surjam a partir disso”, afirma o jovem de 24 anos entre uma passada e outra.

A marcha é o meio termo entre a caminhada e a corrida. O atleta não pode tirar os dois pés do chão ao mesmo tempo. A pisada com a perna esticada, quando o pé de trás saí do solo, dá a impressão ao público de que o atleta está rebolando, por causa do desvio no quadril. Por conta disso, é comum ouvir piadas quando treina nas ruas. “Mas depois de Toronto já percebemos que essas piadas deram lugar a elogios e palavras de motivação. Aos poucos, isso está mudando”, comemora a mãe, que já quebrou um recorde brasileiro e ganhou o primeiro Ibero-Americano do país na modalidade.

O garoto de Sobradinho treina nesta modalidade desde os 16 anos, quando abandonou o futebol, onde chegou até as categorias de base do Brasiliense, para se dedicar à marcha atlética. “A prova de que o futebol neste país está defasado é que perderam um talento desses para o atletismo”, brinca o pai. “Eu acho que eu era um melhor jogador de futebol do que na marcha atlética”, rebate Caio.

A mãe acompanha o filho em quase todas as competições. Essa cumplicidade em família é, na verdade, uma grande aliada para os recentes resultados de Caio – além do bronze em Toronto, ele já participou de duas Olimpíadas e um mundial. “Não me vejo treinando em outros estados porque minha casa é aqui. Não quero perder esse contato diário com meus pais e amigos. Quero ter identidade, poder ser reconhecido como um jovem de Brasília. Alguns preços tenho que pagar por isso, mas até agora tem dado certa essa escolha”, diz ele, hoje bolsista do programa Bolsa Atleta, da Secretaria de Esporte do DF.

Para o esportista, o que melhora resultados não é apenas o treinador. “São as condições dadas. Mesmo assim, nunca vou deixar de ser atleta do meu pai. Pra mim, é um prazer. O esporte nos tornou ainda mais amigos. Quero sempre poder repetir a cena [de Toronto], quando nós três nos abraçamos ao final da prova. Seria apenas uma vitória individual se não fosse por eles, mas somos um time. A gente gosta de estar junto”, diz.

Mas quem vê Caio assim, cheio de desenvoltura e bons resultados, nem imagina que a superação começou quando ele ainda era criança. Aos dois anos, por causa de uma carência de cálcio no corpo, as pernas do garoto começaram a entortar. A cirurgia para corrigir o problema foi um sucesso e Caio se desenvolveu normalmente. Ele sabe que os desafios da vida não o fizeram parar. “Essa é uma outra lição do esporte, a da superação. É preciso usar os problemas como uma força a mais, para ganhar folego para completar a caminhada”, conta.

Com vaga garantida na Olimpíada do Rio, em 2016, o jovem atleta já voltou à rotina e continua treinando no CID Sobradinho. Ainda este mês, ele embarca para o mundial da categoria, que será realizado em Pequim, na China. Para o futuro, Caio pretende utilizar a licenciatura em Educação Física para ser professor. Quer dar continuidade ao trabalho que seu pai deu início há décadas, em Sobradinho, ao acreditar no talento de jovens da cidade. Ele mesmo é prova disso.

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