Dilma afirma que não cogita renunciar

12-08-2015, 21h14

“Jamais cogito renunciar”, diz Dilma

 Dilma

Foto: Reprodução internet

KENNEDY ALENCAR
BRASÍLIA

A presidente Dilma Rousseff diz que “jamais” pensou em renunciar ou em adotar essa atitude em caso do agravamento das crises política e econômica. Afirma que “a cultura do golpe existe” na sociedade brasileira, mas não crê que ele “tenha condições materiais de se realizar”.

Na avaliação de Dilma, uma saída antecipada do poder “não se coaduna com a sociedade moderna” e poderia ser uma ameaça contra outros presidentes que venham a sucedê-la.

“Esse respeito à instituição é fundamental. Não é pra mim. Não é pra meu caso. É pra todos os presidentes que virão depois de mim.”.

Em relação aos protestos marcados para domingo, ela diz ser capaz de “conviver com as diferenças, as posições que não são aquelas que você deseja”. Afirma ser preciso evitar a intolerância, que vê aumentar no país.

“Tem um processo de intolerância como não visto antes no Brasil, a não ser nos períodos passados quando se rompeu a democracia.”

Dilma admite ter cometido erros no primeiro mandato. Cita como exemplo “as amarras” para desenvolver mais a infraestrutura do país.

Para justificar ter feito um discurso na campanha e adotado medidas diferentes no segundo mandato, ela diz que a partir de agosto do ano passado houve o fim do ciclo das commodities na economia mundial. “Eu tive a coragem de mudar, mesmo não querendo fazer e me comprometendo a não fazer”, afirmou. Ela admite que essa mudança da eleição para o governo, com medidas diferentes das defendidas, pode ser a causa da decepção da população em relação ao seu governo, como captou o Datafolha.

A presidente diz que não acredita na perda do grau de investimento, que é o selo internacional de bom pagador do Brasil. Avalia que economia começará a melhorar em 2016. Afirma que não está isolada politicamente. Declara concordar parcialmente com a “Agenda Brasil”, elogiando a iniciativa do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

 

Kennedy Alencar – Eu queria começar falando das manifestações que estão marcadas para o próximo domingo. A oposição se nega a dialogar. O Datafolha mostrou que há uma maioria que reprova o governo. E aquele panelaço da semana passada em relação ao programa de TV do PT mostra que muitas pessoas não querem dialogar nem ouvir os argumentos. Eu pergunto pra senhora: qual é a sua mensagem para esses manifestantes de domingo?

Dilma Rousseff – Eu acredito que nosso país, depois de tantos anos de democracia, temos de ser capazes de conviver com as diferenças, as posições que não são aquelas que você deseja e com situações difíceis. Nós não somos mais uma democracia infantilizada. Portanto, manifestações são coisas normais numa democracia. Em qualquer país do mundo é possível que haja manifestações, que as pessoas repudiem situações. Agora, o que nós temos de evitar é intolerância, porque ela leva a conflitos que não têm soluções. Ela divide um país. Ela transforma algumas manifestações até em processos que levam à violência. Então, intolerância….

KA – A senhora vê aí um fascismo à brasileira se ensaiando? Lançaram uma bomba caseira contra o Instituto Lula. Aquela menina que discursou no Mais Médicos foi agredida no Facebook…

DR – Eu acho que tem um processo de intolerância como não visto antes no Brasil, a não ser nos períodos passados quando se rompeu a democracia. O que não se pode é aceitar qualquer processo de rompimento dos valores democráticos. Um dos valores democráticos é: nós temos que conviver com pessoas que pensam diferente de nós. Nós temos de ser capazes de conviver com pessoas que têm times de futebol diferente, pensamentos políticos diferentes, religiosidade diferente. O que não se pode admitir é que, para manifestar sua divergência, você utilize de instrumentos que pretendam ferir ou destruir patrimônio ou atingir pessoas. Isso não é correto. E eu não acho que o Brasil queira passar por isso. Eu não acho que tenha uma maioria que defenda a intolerância e a violência. Acho que é possível que pessoas localizadas, indivíduos localizados ou grupos localizados façam isso. Agora, não acredito em um Brasil fascista. Sabe por que eu não acredito em um país fascista? Esse país é composto por diferentes etnias. Nós somos índios, negros, brancos de diversas origens. Nós somos europeus, japoneses, árabes. Enfim, nós somos um cadinho. Nesse cadinho, somos capazes de conviver com tudo. Esse país é tolerante por natureza, porque convive com essa diferença. Esse país teve, ao longo de sua história, toda uma tradição de aceitação das mais diferentes pessoas, das mais diferentes procedências. Pode interessar a grupos políticos muito específicos criar um clima de intolerância. Mas ele não vai durar também. Eu não acredito que ele vai durar.

KA – Presidente, falando aí da questão da normalidade democrática que a senhora abordou há pouco, alguns analistas e membros da oposição afirmam que a sua permanência no poder agravaria a crise política e econômica. Defendem uma renúncia como forma de apaziguar a crise política e retomar a confiança na economia. Outros analistas dizem que uma saída da senhora do poder antes da conclusão institucional do mandato, em 2018, lançaria aí uma sombra e uma ameaça, um precedente perigoso para desestabilizar futuros presidentes. Pergunto pra senhora porque essa palavra “renúncia” está na ordem do dia e do noticiário brasileiro. Em algum momento a senhora cogitou renunciar? O agravamento da crise política e econômica pode levar a senhora a pensar nessa saída?

DR – Eu acho fantástico uma questão desse tipo. Eu estava dizendo que o Brasil, que a sociedade não é intolerante. Agora, as elites, algumas vezes nesse país, foram. E foram muito intolerantes. Eu quero lembrar a frase síntese que o Lacerda dizia a respeito do Getúlio. “Não deve se eleger. Se se eleger, não deve tomar posse. Se tomar posse, não deve governar. Se governar, tem de ser destituído.”

KA – A senhora vê esse clima no Brasil de hoje?

DR – Não. Eu não vejo. Eu vejo uma tentativa ainda bastante incipiente e muito artificial de criar um clima desse tipo. Por que eu jamais cogito de renunciar? Porque não é possível que alguém discordando de um processo ou de alguma política pretenda tirar um representante, no caso a presidenta legitimamente eleita pelo voto popular. Então, eu vou te lembrar uma coisa. Por que isso aqui? Eu estava outro dia lembrando do que aconteceu num conflito fortíssimo nos Estados Unidos dentro do Congresso entre republicanos e democratas no que se refere ao teto da dívida. Naquela circunstância, chegaram até a fechar o governo. O governo fechou por não ter recursos para pagar. Agora, ninguém aventou a hipótese, sequer a hipótese, de que o presidente Obama renunciasse ou que se tirasse o presidente Obama. Nós temos de aprender que democracia exige respeito à instituição. Esse respeito à instituição é fundamental. Não é pra mim. Não é para o meu caso. É pra todos os presidentes que virão depois de mim.

KA – Presidente, a senhora falou de Getúlio há pouco. É atribuída à senhora a seguinte frase, e eu queria pra registro histórico saber se em alguma reunião mencionou essa frase: “Eu não sou Getúlio, não sou Jango e não sou Collor. Não vou me suicidar, não faço acordo e não renuncio.” Essa frase é um retrato fiel do que a senhora pensa e de como pretende enfrentar essa crise, presidente?

DR – Olha, eu posso te dizer uma coisa? Eu não disse essa frase, não. Mas acho ela muito interessante. Eu, de fato, não sou Getúlio. Acho que o Getúlio foi um grande governante desse país, responsável pelo Brasil moderno. Então, o que eu queria te dizer é justamente o seguinte: no passado, até a nossa redemocratização, sistematicamente houve tentativas de golpes de todos os presidentes. Esse passado não se coaduna com a sociedade moderna. Você não pode sistematicamente fazer isso com todos presidentes.

KA – A senhora vê uma tentativa de golpe contra a senhora?

DR – Não. Eu acho que a cultura do golpe existe ainda. Mas eu não acho que ela tenha condições materiais de ocorrer, não.

KA – Vamos falar de economia um pouco e da situação que está acontecendo no Brasil. O Datafolha mostrou que 71% dos entrevistados reprovam o governo da senhora. Foi um recorde histórico na série do Datafolha. E 66% defendem a abertura de um eventual processo de impeachment. Até em segmentos que votaram na senhora no Nordeste, uma região tradicionalmente petista, há hoje uma alta insatisfação em relação ao governo. Pergunto pra senhora: esse resultado captado, essa fotografia do Datafolha, não reflete o discurso que a senhora fez na campanha quando disse que o Brasil ia bombar em 2015? A senhora disse que não faria ajuste, disse que não haveria tarifaço, e depois, quando assumiu, aplicou um ajuste com Joaquim Levy, a conta de luz subiu. A oposição diz que a senhora mentiu durante a campanha e recorreu a um estelionato eleitoral. Como a senhora responde a essa crítica?

DR – Veja você. As condições… Quando nós iniciamos a campanha eleitoral, o Brasil era um. Hoje, o Brasil é outro. Durante a campanha eleitoral, houve uma série de mudanças no cenário econômico do Brasil e do mundo que ninguém esperava. Veja você que essas condições começam a se alterar. Eu tive o cuidado de olhar isso do ponto de vista pra todos os países. Não foi só para o Brasil. Elas começam a se alterar a partir de agosto. Em agosto começa o início do fim do ciclo das commodities. É quando começa a cair o preço do petróleo, que até então estava 110 ou 100 dólares o barril. Cai violentamente neste período e até hoje o preço do minério de ferro. Até os alimentos têm uma queda vigorosa. Este fato impacta todos os países, principalmente, a gente considera, impacta os emergentes. E não é no Brasil que aconteceu isso nesse período. Veja você que, além disso, nós tivemos… Ninguém controla. Eu não sei quando vai ter seca ou quando não vai ter seca. Nós esperávamos que, depois de dois anos e meio de seca tanto no Nordeste como esta, absolutamente surpreendente, no Sudeste, nós não tivéssemos o mesmo impacto nas tarifas de energia. Porque as tarifas de energia foram impactadas pelo fato de haver seca. Nós tivemos de poupar água e usar todos os outros combustíveis e pagar por eles. Aí aumentou o preço da energia. Mas eu também disse que não ia ter racionamento e não tem racionamento, porque nós tínhamos térmicas. Agora, eu quero te dizer outra coisa: além disso, se você pegar de agosto de 2014 a agosto de 2015, você tem uma desvalorização do Real de mais de 50%.

KA – Acima das outras moedas…

DR – Acima das outras moedas. Agora, as moedas todas estão fazendo movimento pra se desvalorizar. Você veja que há uma grande desvalorização do próprio Iuan. A China passa pela menor taxa de crescimento dos últimos 25 a 30 anos. Você tem uma recuperação muito pequena ainda na Europa e um pouco de lado nos Estados Unidos. Mas é a única boa notícia os EUA. Hoje, nós vivemos a etapa e ela mudou. O mundo mudou. Neste período, a crise chegou aos emergentes. A crise chega a nós justamente no período da minha campanha eleitoral. Eu tive a coragem de, mesmo não querendo fazer e me comprometendo a não fazer, quando a situação mudou, eu tive de mudar. Isso não é uma questão…

KA – A população não pode entender isso, presidente, como uma quebra das promessas que a senhora fez?

DR – Eu acho que a população pode até entender como uma quebra. Mas a população entenderá diferente quando nós formos capazes de tomar… Tem vários tipos de ajuste. O Brasil hoje, por exemplo, é muito mais resiliente, muito mais forte, muito mais robusto, muito mais estável em sua economia do que foi em qualquer momento passado. Então, nós não vamos, por exemplo, ter crises cambiais no sentido de que, quando o câmbio varia, nós quebramos. Nós temos reservas, mas não é só isso. Nós mantemos os nossos programas de investimento tanto em energia, lançamos ontem um programa de R$ 195 bilhões, quanto em logística. Temos uma recuperação que é completamente diferente do padrão.

KA – Agora, presidente, é importante perguntar isso pra senhora. A senhora invoca a crise econômica internacional que, de fato, teve impacto sobre o país, e a questão da falta de chuvas. Mas muitos críticos já apontavam, em 2013, a necessidade de correção de rumos, questionando a dosagem da política fiscal e monetária. Na visão deles, houve um excesso de intervenção na Petrobras. Na visão desses críticos, houve uma tolerância em relação a inflação. E até aliados do governo faziam esse tipo de crítica. Se essa correção de rumos já tivesse tido início em 2013, o custo desse ajuste do ponto de vista do desemprego, do impacto sobre a renda das famílias e sobre as empresas não teria sido menor? Não teria valido a pena ter começado essa correção de rumos antes, presidente?

DR – Sabe que a coisa mais difícil de você fazer é medir “e se não tivéssemos feito isso?”. Então, eu vou te dizer o “e se não tivéssemos feito o seguinte”: primeiro, a crise começou em 2008. Desde 2009, nós tomamos medidas, primeiro no governo Lula e depois no meu governo, pra impedir que ela atingisse de forma profunda o emprego e a renda das famílias. Esses críticos queriam que a gente deixasse, por exemplo, com uma situação adversa do dólar. Ou seja, a indústria muito menos competitiva. A gente não tivesse subsidiado o crédito para a indústria poder investir. Não tivesse subsidiado a agricultura para ela investir. Não tivéssemos feito o programa “Minha Casa, Minha Vida” para segurar a construção civil. Não tivesse feito os estímulos que nós fizemos tanto nos programas como o Inovar-Auto, que buscava trazer pra cá a produção de automóveis pra reduzir o desemprego que pudesse nos afetar. Se tudo isso não tivesse acontecido?!

KA – Ou seja, no seu entendimento o Brasil estaria pior?

DR – Muito pior. E vou te dar um exemplo nessa questão das tarifas de energia. Em 2013, nós reduzimos as tarifas de energia não porque estávamos rasgando contrato, mas porque a maioria das hidrelétricas tinha pagado o tempo de amortização necessário para construí-las. Com isso, nós reduzimos em 18% a tarifa de energia das famílias e em 32% das empresas. Quando a seca começa, nós temos de aumentar a tarifa de energia. É imprevisível se vai ter seca ou se vai chover. E nós criamos um modelo pra regular isso. Então, eu te pergunto o seguinte: se essa redução não tivesse havido, qual hoje seria o impacto? Seria o impacto em cima de mais 18% e mais 32%. Então, é fácil olhar depois da obra feita e falar “não faz isso”. Agora, é difícil dizer o seguinte: se aquilo não tivesse sido feito, o que aconteceria com as pessoas e com as famílias?

KA – Cresceu nos últimos dias e jornalistas escrevem em artigos “a presidente devia reconhecer erros”. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fala “a presidente Dilma deveria reconhecer erros”. O ex-presidente Lula disse ontem na Marcha das Margaridas “a presidente Dilma pode ter errado”. Nós temos um quadro hoje, presidente…

DR – Eu não acho que eu não errei, não. Eu sou completa e inteiramente humana e eu posso ter cometido vários erros. O que eu estou querendo dizer é que os erros não são justamente esses que falam. Mas cometi vários erros.

KA – Quais são os erros na política e na economia que a senhora acha que cometeu no primeiro mandato?

DR – Eu acredito que eu devia ter me esforçado ainda mais pra garantir que o Brasil não tivesse tanta amarras pra investir. No caso, o que estou dizendo é infraestrutura. Eu poderia ter… É difícil fazer. Olhando hoje eu posso dizer é difícil. Mas poderia ter me empenhado mais ali pra fazer mais coisas. Sempre você pode se empenhar mais.

KA – E a questão política com o PMDB. Durante muito tempo se falava que a Dilma quer enquadrar o PMDB para o segundo mandato. O Michel Temer está isolado. A Dilma quer enfrentar o Eduardo Cunha. Não errou nessa relação, porque hoje a gente vê um Congresso rebelado, presidente?

DR – Eu acredito que o Congresso é… Eu posso ter cometido qualquer coisa…

KA – Não faltou mais política?

DR – Não tão precisa com o Congresso. Mas eu quero te falar uma coisa: eu não posso te dizer aqui que eu acho que o Congresso que eu tive nesses últimos anos foi ruim. Pelo contrário. Nós não tivemos nenhum grande, até hoje, tem tentativas…

KA – Tem essa “pauta bomba” aí.

DR – Eu sei, mas tem tentativas.

KA – A senhora está tentando desarmar a bomba, mas tem gente tentando detonar.

DR – Eu estou querendo falar, Kennedy, daqui pra trás, o que já ocorreu. Do que já ocorreu, vamos lembrar o seguinte: ninguém teve, até a mim, os seus vetos avaliados. O veto começou a ser avaliado agora. Nenhum dos governantes anteriores teve isso. Fernando Henrique, por exemplo, governou com medida provisória sem o menor problema. O Lula não teve veto, assim como o FHC e nenhum outro. Foi a primeira vez no meu governo.

KA – Pois é. O Congresso está mais hostil à senhora.

DR – Calma. Eu vou te falar. É prerrogativa correta do Congresso analisar veto presidencial. Aí você podia me perguntar “e qual é o resultado?”. Dos mais de 3 mil vetos, só tive um derrubado, o que mostra um Congresso extremamente cooperativo. O que não está correto agora é diferente do que ocorreu. Nós passamos o Marco Regulatório dos Portos. Nós passamos uma série de medidas sem problema nenhum.

KA – Mas agora há uma rebelião na Câmara pelo menos?

DR – Eu acredito que esta rebelião tende a ser vista daqui pra frente com uma certa diferença. Eu não acho que a Câmara não tem responsabilidade perante o país. A trajetória dela não mostra isso. Não acredito que as chamadas “pautas bombas” vão proliferar no Congresso. Acho que o Congresso tem uma tradição de estar adequado ao ritmo do país.

KA – A questão do grau de investimento, presidente. A Moody’s reduziu a nota ontem. Ainda mantivemos o grau de investimento, mas há uma avaliação das agências, uma preocupação: a dívida pública que estava em torno de 53% em 2013 está hoje no patamar de 65, 66%…

DR – Uma das menores dívidas públicas do mundo.

KA – Mas os analistas temem que chegue a 70%. E, se chegar a 70, pode perder o grau de investimento.

DR – Nós não acreditamos nisso. Vou explicar por que nós não acreditamos. Acho que as agências de risco mostraram um grande empenho nessa questão da governabilidade, da política. Mostrando que a questão do Brasil, em termos de economia, nós temos todo um roteiro de saída das dificuldades da crise que estamos.

KA – O problema está na crise política?

DR – O primeiro, deixa só eu explicar isso, primeiro, acho importante a retomada das exportações, tanto pelo câmbio mas também pela política nacional de exportações, que vai simplificar processos, acabar com a burocracia e permitir novos acordos comerciais. Nós já temos esse resultado aparecendo nos saldos da balança de pagamento. Numa segunda etapa, que já iniciou-se, tanto os investimentos na área de logística, rodovia, ferrovia, portos e aeroportos. E vamos lembrar que empresas se interessaram extremamente pelos nossos projetos de logística. E foram mais de 300. Além disso, lançamos ontem um programa de energia elétrica. Por que eu falo nos dois? Porque o Brasil pra crescer precisa de infraestrutura, onde eu falei que eu acho que eu podia ter acelerado e por isso estou acelerando.

KA – Mas na política está o problema não?

DR – Só eu continuar. Além disso, o que eu acredito: eu acredito que nós mantemos a nossa grande conquista que é a distribuição de renda. A distribuição de renda vai permitir e tem permitido que nós tenhamos um forte mercado interno. Como eu acredito que teremos uma redução de inflação, até já prevista pelo mercado. O mercado já prevê essa redução.

KA – 5, 4 no ano que vem.

DR – Convergindo para uma inflação mais baixa. Com a recuperação das exportações e da infraestrutura, nós acreditamos que começa a retomada do crescimento no Brasil.

KA – Quando? Melhora quando na sua opinião?

DR – A tendência é melhorar mais pro fim do ano e mais pra 2016. Com isso, o que acontece? Você pode retomar o ciclo de crédito, de expansão de crédito. Nós temos uma taxa de endividamento ainda baixa no Brasil, mas para isso a gente precisa de controlar a inflação. Pra aumentar o crédito tem de controlar a inflação e tem de melhorar o fiscal do país.

KA – Eu estou preocupado com o tempo aqui.

DR – Aí eu chego na política.

KA – Vamos na política.

DR – Eu acredito que, no Brasil, o humor na política decorre do humor na economia. Agora, o que não é possível é que a política comprometa a recuperação econômica. Por isso que não é possível as “pautas bombas”. Não é possível dar reajuste de 70% pra ninguém em nenhuma parte do mundo. Não é compatível com as finanças do país. Você não pode ter irresponsabilidade e não pode aceitar a teoria do quanto pior melhor. Porque aquela teoria do quanto pior melhor que é usada na política, como ela repercute na economia e na vida das pessoas? O pior acaba afetando a população. Não impedir que a política contamine a economia é impedir “pauta bomba” necessariamente. Você usou o termo “tem de desmontar a bomba”. Eu não digo isso. Eu digo outra coisa: tem de aumentar a consciência e a responsabilidade em relação ao país.

KA – O Congresso tem de ter essa responsabilidade?!

DR – Todos nós: o Congresso, o Executivo, o Judiciário, cada ministro, porque é muito fácil gastar quando tem dinheiro. Mas, quando não tem dinheiro, você tem de fazer mais com menos. E isso que cada um de nós tem de absorver. Não é só o Congresso. Cada ministro, cada funcionário público e também todas as entidades tem de perceber que o país não comporta, nesse momento, e não é porque ninguém não queira dar, não comporta certos reajustes.

KA – Presidente, é importante. Pra combater a crise política há um bastidor de que a senhora estaria analisando realizar uma reforma ministerial e até possibilidade de reduzir ministérios. São 39 ministérios, mas há 38 ministro porque a articulação política está a cargo do vice-presidente Michel Temer. A senhora está avaliando realizar uma reforma ministerial e é possível que nesta reforma haja a redução do número de pastas?

DR – Olha, Kennedy, eu não vou te adiantar medidas que ainda não estão prontas e não foram profundamente discutidas. Mas eu quero te dizer que várias medidas de reformas, tanto micro como macroeconômicas, estão no radar do governo.

KA – Inclusive redução de ministérios?

DR – Eu não vou me comprometer com nada muito específico que não está pronto. Eu geralmente utilizo o seguinte: outro dia queriam que eu dissesse quanto ia ser o investimento do Plano de Investimento em Energia Elétrica. Nós lançamos hoje. Hoje é o dia. É R$ 195 bilhões. Se fosse R$ 187, falariam que eu errei, que eu não quis dar o número verdadeiro. Se eu falasse que seria R$ 198 e fosse R$ 195, diminuiu. Então, a gente não fala essas coisas antes de fazer.

KA – Vamos para a política. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, votou em regime de urgência contas de outros governos que estavam paradas havia 20 anos. Claramente está abrindo caminho pra tentar analisar as contas da senhora do ano passado. Já deixou correr prazo para pedidos de abertura de processo de impeachment. Na semana passada, na quarta-feira, quando se votou uma Proposta de Emenda Constitucional, 445 deputados votaram a favor. Até o PT não votou com o governo. Pra se abrir um eventual processo de impeachment, é preciso do apoio de 2/3 dos 513 deputados: 342. Pra evitar é preciso de 1/3: 171 deputados. O governo tem força hoje, presidente, caso prospere essa manobra do Eduardo Cunha, pra barrar a votação de um eventual pedido de impeachment contra a senhora?

DR – Você faz 20 perguntas numa só.

KA – E peço pra senhora responder rapidinho.

DR – Ah é! E pede pra responder rapidinho. É desigual isso. Eu queria te dizer o seguinte: se você olhar o Congresso, sempre tem algumas pautas extremamente atraentes e é compreensível, porque o Congresso representa a sociedade. Essa PEC que você se refere é a PEC que aumenta em proporções bastante significativas todos…

KA – O advogado-geral da União passa a ganhar 90% do que ganha um ministro do Supremo. É uma vinculação.

DR – Não é só o advogado-geral da União. Delegado, a Receita. Isso afeta não é o governo federal só.

KA – Tem um efeito cascata.

DR – Tem um efeito cascata e é absolutamente impensável num momento de dificuldades que nós estamos vivendo. Mas não só. O Brasil não suporta isso com taxas de crescimento que tivemos recentemente. Não suporta isso. Tanto é que todas essas PECs estavam engavetadas. O que eu te digo é o seguinte: acho que essa perda no primeiro turno, ainda tem um outro turno, não representa, eu acho, uma posição do Congresso contra o governo.

KA – Ou seja, a senhora tem força pra barrar processo de impeachment?

DR – Eu não vou responder isso.

KA – Por que?

DR – Eu não vou responder isso, porque quando ocorrer, e se ocorrer, a gente conversa sobre. Eu não antecipo situações deste tipo. O que eu acho que a gente tem de perceber é que quando eu peço responsabilidade é pra avaliar, mesmo compreendendo que as pessoas têm essa sensibilidade em relação às diferentes corporações, não é o momento de fazer isso. E mais: eu acredito que a gente tem de perceber que nós entramos numa nova etapa no mundo. Não é o Brasil que entrou. O mundo mudou de patamar. Acabou o ciclo de industrialização da China. Nada será tão fácil como foi na última década. A partir de agora vamos ter de apostar muito em investimento, produtividade, educação e qualidade.

KA – Pergunta bem curtinha agora, presidente. O vice-presidente da República falou na semana passada que alguém precisava reunificar a base. Muitos interpretaram como um gesto para enfraquecê-la. Como a senhora viu o gesto do vice-presidente?

DR – De maneira alguma eu vejo assim. E quero te dizer que é pelo contrário! O vice-presidente, antes de fazer essa declaração, conversou comigo. Ele estava extremamente emocionado diante do fato de que era impossível aquela votação. Então, ele estava se referindo a unificação da base no Congresso. Eu não acredito nesse tipo de especulação. E quero te dizer mais: a contribuição do vice-presidente para o meu governo tem sido sistemática. Já se deu desde o passado, quando ele fazia o plano de proteção das nossas fronteiras, coordenando as Forças Armadas juntos com o Ministério de Defesa e a Polícia Rodoviária Federal com o Ministério da Justiça. Depois, em várias ações que ele teve no sentido de melhorar as relações do Brasil com o resto do mundo, visitando vários países e contribuindo pra nossa política externa. E agora na articulação política. Então, eu acho o seguinte…

KA – Não tem intriga entre a senhora e o Temer?

DR – Não tem intriga entre mim e o Temer. Ela não dura.

KA – O PT e o ex-presidente Lula minimizaram o mensalão em muitas ocasiões. O ex-presidente Lula chegou a falar que era até uma tentativa de golpe. Agora, os investigadores da Lava Jato comparam o esquema de corrupção na Petrobras ao mensalão. Eu pergunto pra senhora: o PT não foi leniente com corrupção praticada por membros do partido e não está repetindo esse comportamento agora em relação à Petrobras?

DR – Eu, como Presidente da República, não posso julgar. Eu, como Presidente da República, não posso ter uma atitude de avaliação ou de criminalização. Agora, como Presidente da República, posso fazer algumas coisas: defender a autonomia do Ministério Público.

KA – Acabou de indicar Janot novamente.

DR – Acabei de indicar o Janot novamente. Essa independência do Ministério Público que eu me referi está prevista na Constituição. Então, eu tenho a obrigação constitucional de fazer isso. Então, é algo que eu tenho de defender. Eu tenho de defender a autonomia da Polícia Federal. Eu falei autonomia do Ministério Público, mas não é. Do Ministério Público é independência. Tenho de que defender a autonomia da Polícia Federal pra investigar. Tenho de defender e respeitar as decisões judiciais.

KA – Investigar o Dirceu e o Vaccari não afeta o governo e o PT? A imagem?

DR – De qualquer maneira, eu também tenho de defender o direito de defesa. Eu só vou externar juízos quanto a pessoas a partir do completo direito de defesa. Agora, eu sou a favor de que se investigue e que se puna todos crimes ou malfeitos previstos na lei. Nada arbitrário. O que está previsto na lei tem de ser feito.

KA – Como tem de ser feito numa democracia.

DR – É. Não é uma questão de vontade minha ou de quem quer que seja. É isso que torna, o respeito a esse arcabouço jurídico é que constrói e constitui a democracia.

KA – Agenda Brasil. A senhora disse ontem que era bem-vinda essa sugestão do Renan. O Arthur Chioro, o ministro da Saúde, falou que é muito complicado aprovar um dos pontos, que é uma cobrança diferenciada do serviço do SUS de acordo com a renda. Há sugestões para se rever normas de reservas indígenas, de acelerar a licença ambiental, o que fere movimentos sociais que estão se reaproximando da senhora. Essa Agenda Brasil não é difícil de ser aprovada ou a senhora acha que é possível viabilizá-la?

DR – A ideia, pelo menos é assim que a gente entende, é uma proposição. E nós vamos discutir. Tem muita coisa boa nessa agenda. Agora, tem várias coisas que o governo eventualmente não concorda. Isso não significa que a agenda toda não seja valorosa, não dê uma contribuição para o país e não tenha sido uma grande iniciativa do presidente Renan propô-la. É óbvio que, em vários aspectos, nós podemos não concordar. Agora, o que eu acho que é a grande vantagem desta agenda é que ela coloca a necessidade de uma pauta que seja construtiva para o conjunto do país. Que beneficie o conjunto da população.

KA – Ajude o governo a sair do isolamento também?

DR – Que ajude a discussão.

KA – Ajuda a discussão. Ajuda a sair do isolamento político, presidente?

DR – Não acho que nós estamos num isolamento político. Eu acho que tem muita volatilidade nas avaliações políticas e que isso contamina o ambiente. O governo tem uma base, conversa com essa base. Tem uma relação institucional com o Judiciário, com o Legislativo. Acredito que nós temos uma coisa em comum, todos nós. Aqueles que têm interesse que o Brasil saia mais rapidamente desta situação de dificuldade, retome o crescimento, gere mais emprego, gere mais renda, mantenha todas as conquistas que nós nesses últimos anos tivemos, aqueles serão sempre os grandes parceiros. São eles que não nos deixam isolados.

BLOGDOFERNANDOCORREA

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